quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Eu sou. E você, não?



*Por Ísis Coutinho

Eu sou um ser POLÍTICO!

A política é a forma que temos de pensar na organização, administração e direcionamento das questões da “pólis” (cidade). Esta idéia tem origem em Aristóteles que, em sua Política, objetivava investigar formas de governos e as instituições capazes de assegurar uma vida feliz ao cidadão. Fazemos política em diversas instâncias da nossa vida coti diana. Na escola, no trabalho ou mesmo na igreja, estamos sempre tendo atitudes que são “políticas”, ainda que envoltas por uma intenção de suposta neutralidade.

Para Robinson Cavalcanti no seu livro “Cristianismo e Política: teoria bíblica e prática histórica” (2004), ser apolítico é assumir um lugar de omissão, uma pretensão conceitual impossível de se realizar. Para os cristãos, seria uma forma de “espiritualização” do pecado intentar ser alheio aos processos relevantes que envolvem a nossa sociedade, sob qual podemos agir no combate às diversas manifestações de injustiças. 

Por sua vez, Marcos Monteiro, em “Um jumentinho na Avenida” (2007), encoraja a Igreja a exercer o seu papel como modelo e agente do Reino de Deus atuando nas situações de pobreza da sociedade, sendo um agente que possibilite a transformação dos indivíduos à medida que eles possam ser agentes de sua própria transformação: “Faz parte da missão da Igreja, na luta pela erradicação da pobreza, promover o pobre concreto, considerado em sua realidade histórica, política, social, emocional e religiosa”.

Assim, posso dizer que a Igreja também é um lugar de política. Um lugar para se debater idéias, construir ações que vão de encontro à necessidade que a cerca e para isto, precisa trabalhar pela formação de pessoas comprometidas com a missão do Reino de Deus.

Sou integrante da Campanha Contra o Voto de Cajado, promovida pela Rede Fale-RJ. Em menos de uma semana, a campanha já obteve mais de 600 compartilhamentos no Facebook e suscitou o interesse de sites e blogs de todo o Brasil. Certamente, estou satisfeita com esse tipo de repercussão. 

Nasci e fui criada em uma igreja cristã tradicional, e nunca antes na história do povo evangélico, discutiu-se tanto sobre política. Não vou me ater a nenhum tipo de juízo de valor sobre o nível deste debate, mas de alguma forma, a política entra nos nossos cultos, nem que seja nos momentos de oração.

Penso que este fenômeno é fruto de uma acentuada inserção dos cristãos em espaços de construção do pensamento, como é o caso das universidades. O contato com este “mundo” nos traz demandas escondidas atrás das paredes de nossas igrejas. Também é certo pensar que esta aproximação trouxe os malefícios desta relação, como o aculturamento ético que sofremos ao deixarmos certos valores não cristãos se institucionalizarem no interior das relações de nossa comunidade eclesiástica.

As lideranças religiosas devem sim trabalhar conceitos, questões pertinentes às formas de agir e viver no mundo; em especial, pensando nos princípios cristãos tão caros para nós. A igreja é sim um espaço de formação espiritual e política (no que se refere ao debate de idéias). Se somos intrinsecamente seres políticos, devemos saber articular estas dimensões do nosso ser no exercício da nossa vida enquanto sujeitos no reino de Deus (que já chegou!).“A minha boca falará de sabedoria, e a meditação do meu coração será de entendimento (Salmos 49:30)”. O que eu sou hoje é fruto de todas essas relações dentro e fora da igreja.

A minha opinião não é qualquer opinião! Ela é resultado de todos os espaços de formação que eu participei, das aulas que me foram ministradas, das conversas de corredores, dos posicionamentos e discursos de pessoas que tomei como referência em determinadas áreas. Isso tudo me permitiu construir as bases para que, em diversos momentos e espaços, eu pudesse tomar decisões e emitir pareceres sobre determinados assuntos e orientar a minha prática cidadã deste mundo e do reino espiritual. “E não sede conformados com este mundo, mas sede transformados pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus (Romanos 12:2)”.

Finalizando com Descartes: “Penso, logo existo”. Se existo é porque penso. Furtar-me de fazê-lo ou deixar que alguém furte isto de mim é o mesmo que negar a minha própria existência, com todas as suas potencialidades e responsabilidades. O voto é meu direito e dever. Devo escolher candidatos que demonstrem estar sensíveis as causas das minorias e estejam preocupados em governar para todas as pessoas sem distinção.Os princípios que queremos encontrar não estão nas mãos das pessoas que querem comprar o nosso voto ou que se dizem nossos irmãos na fé. A Bíblia fala que seremos conhecidos pelos frutos. Assim também, os candidatos que se apresentam como alternativa dos “céus” para nós. Questionar determinadas coisas não é um ato de rebeldia, mas de consciência.

É por esse motivo que sou contra o “voto de cajado”, porque crer é ter a liberdade de discernir espiritualmente sobre atitudes concretas que devo realizar enquanto cidadã espiritual neste mundo.

*Ísis Coutinho é mestranda do curso de Mestrado em Educação Profissional em Saúde e Assistente de Pesquisa na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio/ FIOCRUZ, e integrante da Rede Fale-RJ.

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